Hoje, no dia 14 de Setembro, não poderíamos deixar de lembrar o significado da festa que a Igreja Católica celebra A Exaltação da Santa Cruz festeja aquele que foi o instrumento da Redenção do Gênero Humano, mas também rememora uma batalha que tem relação com a relíquia da Santa Cruz.
No começo do século VII, mesmo antes de os sucessores de Maomé irromperem sobre a Síria e a África, uma sombra crescia no Oriente pagão, onde a Dinastia dos Sassânidas, tendo o governo da Pérsia e da Mesopotâmia, ambicionava a conquista das terras que outrora fizeram parte do Império Aquemênida.
A Síria, o Egito e a Ásia Menor pertenciam ao Império Romano do Oriente, ou Império Bizantino, como costumamos dizer. Herdeira de Roma, Bizâncio manteve a dignidade Imperial na Pars Orientis, onde a capacidade de Imperadores - como Justiniano - e de seus generais - como Belisário e Narses - não só manteve territórios, como reconquistou terras perdidas nas Invasões Germânicas.
Contudo, no começo dos anos 600, o Império Romano do Oriente estava em desagregação, sofrendo ataques em todas as frentes: os Visigodos ameaçavam seus territórios na Espanha; os Lombardos, invasores germânicos retardatários, atacaram o Norte da Itália; Ávaros, cavaleiros das estepes orientais, ameaçavam os Bálcãs, onde a muito custo os Eslavos suportavam o jugo bizantino.
Desgastada internamente por guerras partidárias – facções políticas, os Azuis e os Verdes, levavam o caos às ruas da capital -, Bizâncio se viu novamente em guerra com os Persas. Estes avançaram vitoriosos: tomaram Antioquia (610), Damasco (612) e Jerusalém (614), onde mataram grande número de cristãos e puseram outros milhares em cativeiro, inclusive o Patriarca Zacarias. Dentre as profanações, os Persas incendiaram a Igreja do Santo Sepulcro, de onde arrebataram a Relíquia da Verdadeira Cruz, levada para a Pérsia como troféu de guerra.
A consternação com a tomada de Jerusalém foi sentida em toda a Cristandade, o que não foi suficiente para solidarizar os reis que carregavamo nome de cristãos: os Francos ainda viviam as guerras civis entre os degenerados netos de Clóvis; os Visigodos só pensavam em tirar proveito das fraquezas de Bizâncio para arrancar-lhe mais territórios; os Lombardos, mal convertidos ao cristianismo, ainda imersos na heresia ariana, ameaçavam as possessões bizantinas na Itália, aterrorizando, inclusive, o Papa.
Em 618, Alexandria passava às mãos dos Persas que, implacáveis, pareciam finalmente restaurar o Antigo Império Aquemênida: o Mediterrâneo viraria um Mar Persa? As derrotas de Dario e Xerxes, 900 anos antes, teriam sua desforra? A perda de Alexandria privava Constantinopla do abastecimento de trigo, o que logo desencadeou fome na cidade. Calcedônia caiu sob os Persas, que doravante se viam em posição de ameaçar a própria capital .
A reação partiu de um novo Imperador: Heráclio (610-641). Filho do Exarca (governador) de Cartago, Heráclio foi entronizado após a morte de seu antecessor em meio à guerra civil promovida pelas facções Azuis e Verdes. Homem de capacidade militar e sólida formação intelectual, aos poucos submeteu as facções políticas à sua autoridade, pondo fim às desordens civis. Com a colaboração do Patriarca Sérgio, o ouro e a prata das igrejas foram derretidos e usados para pagar mercenários e comprar a neutralidade dos Ávaros. Com as disputas políticas encerradas e cessadas as ameaças Ávaras, Heráclio pôde conduzir seu exército para o Oriente.
Concebendo uma manobra ousada e ao mesmo tempo indireta, evitou atacar os Persas em Calcedônia, o que parecia um passo lógico para aliviar o cerco à capital. Em vez disso, deixou que Constantinopla resistisse bravamente e seguiu para as montanhas da Armênia e do antigo território de Urartu: atravessou-as e irrompeu sobre as planícies da Mesopotâmia, onde, perto das ruínas de Nínive, derrotou o Imperador Cosroés II dos Persas (627).
A derrota foi tão patente, que os persas não tiveram alternativa a pedir a paz. Khawad, pérfido filho de Cosroés, assassinou o próprio pai e selou o fim da guerra. Os exércitos persas que sitiavam Constantinopla, ao saberem da derrota sofrida em seu próprio território, tentaram revertê-la, mas foram derrotados.
A Relíquia da Verdadeira Cruz foi solenemente restituída à Igreja do Santo Sepulcro (629) e, de lugares tão distantes quanto a Índia, felicitações foram enviadas ao Imperador Heráclio.
A tradição de comemorar a Recuperação da Relíquia da Santa Cruz já existia desde o século VII, e no calendário Romano sempre foi celebrada no dia 14 de setembro, assim como entre os Ortodoxos, que comemoram o encontro da Cruz por Santa Helena e também a restituição de sua relíquia à Igreja do Sepulcro. O compromisso entre os Missais Galicano e Romano, que originou o Missale Romanum Lateranensis, consolidou a data de 14 de Setembro como a Exaltação da Cruz, em comemoração à vitória do Imperador Heráclio e a solene devolução das Relíquias.
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